O prazer de ler


por Maria José Ascensão

Eu leio, tu lês, ele lê, nós lemos, … Não, não se trata de um mero exercício de conjugação verbal, mas sim do que se espera seja a nota dominante nos próximos dias.
Este número do Etc sai em plena semana da leitura. Não poderia ser, pois, mais oportuno. Ler, ler mais, ler com prazer é condição de sucesso desta semana que o agrupamento consagra à leitura. Quase todos conhecemos os mais variados estudos, mais ou menos estatisticamente significativos, que revelam a falta de hábitos de leitura na população em geral e, em particular, entre os jovens. Constata-se até frequentemente casos de aversão à leitura e ao livro. Quando um professor sugere ou refere a necessidade de leitura de uma dada obra, é comum encontrar reacções do tipo: Quantas páginas tem o livro? Onde se arranja o resumo? Evasivas muitas vezes determinadas pelas dificuldades que o aluno sabe que irá sentir, nomeadamente nas obras de referência dos programas. Se analisarmos retrospectivamente, percebemos que, muitas vezes, o processo não evoluiu do simples para o complexo; as etapas mais básicas não foram cumpridas e o resultado recai no aluno: ele é “culpado” de não gostar de ler. Lê simplesmente por obrigação, sem o mínimo gosto pelo que faz. Há que inverter a situação. Como criar o desejo pela leitura? As pessoas aprendem a gostar de ler quando sentem que a leitura melhora a sua vida. É importante despertar o interesse e a curiosidade do aluno, para que ele vá ao encontro do livro. A escolha deve, pois, começar por ser criteriosa e orientada, para estimular o leitor.
Um livro transporta-nos a outros universos, permite-nos viajar no tempo e no espaço, da realidade à ficção. Lendo, podemos ser nós próprios, retratados nas personagens, ou ser quem nós quisermos, dando asas à imaginação, sonhar, entrar num mundo mágico onde tudo é possível. As palavras entram em nós, tomam conta dos nossos sentidos e despertam emoções, mesmo as que julgávamos bem guardadas. Para isso acontecer, temos de lhes dar uma oportunidade. As palavras comunicam saberes, mas também cores, sabores, aromas, sons, ritmo. Como a música, cada texto literário tem o seu próprio tempo. Uns parece que correm, outros flúem numa cadência lenta e calma, propícia à degustação. Lido em silêncio ou em voz alta, sozinho ou no meio de uma multidão, nos transportes públicos, no conforto do sofá ou na intimidade do quarto antes de dormir, um livro é um amigo que está sempre lá, que não se queixa da nossa desatenção, da nossa infidelidade ou até do nosso desleixo. Faz-nos companhia quando todos os amigos foram embora, quando estamos tristes ou simplesmente quando temos um tempinho livre. O livro partilha os seus segredos connosco, criando uma cumplicidade que só nós conhecemos. Partilhar um livro é também dividir essa experiência, aproximar as pessoas, criando referências comuns. Recordo o tempo em que um livro era um presente muito apetecido. Hoje em dia, o livro concorre com novas e atractivas tecnologias, mas pode perfeitamente ser-lhes complementar. Afinal é portátil, não precisa de pilhas ou carregador, tem grande memória em termos de texto e imagem, é acessível a todos e usa tecnologia intemporal.
A leitura abre caminho à escrita. Para escrever precisamos de argumentos e para isso devemos ler, mas ler com prazer, o prazer de descobrir, de sentir, de saborear.
Abra um livro! Folheie-o, sinta o seu toque. Deixe-se prender pelos mistérios que ele encerra. Ele está a sua espera. Pode trocá-lo por outro ou até ler vários ao mesmo tempo que ele não se queixa. Amigos destes, há poucos. Não os perca. Vai ver que vale a pena.
A Semana da Leitura é certamente uma óptima oportunidade para estimular o gosto e o apetite pelos livros e para aproximar gerações através deles.
Ler é bom e faz be

Comentários

José Emídio disse…
Gostei bastante do texto.
Pareceu-me um texto muito bem construído, apoiado numa base pedagógica muito segura, fundamental para a sensibilização permanente que é preciso fazer, no sentido de aproximar as pessoas dos livros.
Sou Pintor, tenho desenvolvido um trabalho, já longo, na ilustração e tenho constatado, cada vez mais a importância que os livros devem assumir na educação/formação dos nossos alunos.
Obrigado
José Emídio

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