Bioética


pelo Doutor Rui Nunes (antigo aluno do Liceu D. Manuel II, Professor Catedrático da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto)

Quando, em 1970, Van Potter introduziu o termo “bioética” na literatura científica internacional não teve porventura a noção do impacto desta área na evolução da sociedade contemporânea. Pode afirmar-se, hoje, que a bioética atingiu a sua maturidade enquanto área científica, académica e de intervenção social, que busca incessantemente os ideais de justiça, igualdade e autorrealização pessoal.



De facto, e como refere Luís Archer, a bioética eclodiu há cerca de quatro décadas como um grito de alerta vibrado por médicos e biólogos, face às incríveis possibilidades das novas tecnologias. Perante os novos poderes que a ciência dá ao homem sobre a vida e sobre si próprio, é imperioso que a sociedade tome consciência de todas as suas consequências a longo prazo e, num diálogo transdisciplinar e pluralista, aberto a um público cada vez mais informado, tome todas as decisões necessárias para evitar a degradação da vida e da terra, possibilitando a sobrevivência do homem no nosso planeta. A medicina e a ciência não podiam escapar a este desafio, ou seja, numa perspetiva plural e interdisciplinar, questionar o alcance bem como os limites da tecnologia biomédica no ser humano. Questionar ao abrigo de princípios que devem, para além de identificar a questão nuclear, analisá-la em termos dos valores defendidos pelas correntes mais representativas do pensamento humano.



De facto, a medicina e a ciência devem concorrer sempre para melhorar as condições de existência da humanidade respeitando a identidade do sujeito e a da espécie a que pertence. Esta linha de pensamento está na base da edificação daquilo que hoje conhecemos e valorizamos por direitos humanos fundamentais. Estes mais não são do que o reconhecimento expresso de um marco axiológico fundamental que é o valor intrínseco, inquestionável, da pessoa humana. E o seu caráter não-instrumental. Numa perspetiva mais abrangente, e também mais global, bioética pode ser considerada simplesmente como “amor pela vida”. Assim, a bioética ainda que tivesse originalmente um significado mais lato, nomeadamente relacionado com a preservação da biodiversidade, rapidamente veio debruçar-se sobre as questões éticas colocadas pelas ciências biomédicas. Por exemplo, a procriação medicamente assistida, a clonagem de seres humanos, o estatuto dos embriões in vitro, a biologia sintética, a repro-genética, a eutanásia, o testamento vital, etc. Todos este temas devem ser hoje abordados sem qualquer reserva intelectual de acordo com princípios éticos universais de respeito e de tolerância por diferentes convicções.



A bioética estabeleceu-se, então, como um novo domínio científico, muito embora de cariz transdisciplinar. A dicotomia inicial em torno desta área parece agora esbater-se no sentido de se atingir a globalidade. Bioética global significa não apenas a adoção de uma ética universal mas também a inclusão de todas as questões que respeitam às ciências da vida.



E a escola é o local ideal para que todos estes temas sejam debatidos com frontalidade de modo a que os jovens, desde cedo, comecem a perceber a incrível dimensão ética das novas tecnologias.

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